A arbitragem brasileira passa por um momento de crise. Árbitros estão sendo afastados após erros crassos, dirigentes se esbravejam em coletivas, e o alto comando da CBF tenta se explicar.
A frase acima é atemporal, mas representa bem as últimas semanas no futebol do país. As discussões sobre apito tomaram conta das pautas dos programas esportivos e nas mesas de bar pelo país. Sálvio Spinola e Renato Marsiglia, ex-árbitros que acompanham de perto as questões envolvendo as suas antigas ocupações, concordam que a arbitragem brasileira vive um momento de crise.
“O momento é crítico por conta do investimento pesado que a CBF fala que faz na arbitragem. A estrutura da arbitragem brasileira, hoje, é muito pesada: são 11 instrutores, com uma estrutura bem recheada, com muito treinamento, investimento e capacitação dos árbitros.
Erros de arbitragem há no mundo inteiro, até em Copa do Mundo. A relação investimento e o momento de crise é desproporcional”, opina Salvio, que se aposentou em 2011, após 15 anos de atuação também como árbitro da Fifa.
Caminho é a profissionalização
Um fator a ser analisado quando o assunto é arbitragem é que no Brasil os árbitros não são profissionais, não possuem carteira assinada ou contrato de trabalho com a CBF ou federações estaduais.
Ou seja, apesar de trabalhar em arenas de Copa do Mundo e ser o responsável por delegar partidas que movimentam bilhões de reais, a equipe de arbitragem inteira não tem nenhuma garantia de renda fixa no futebol.
Na Premier League, considerada por muitos como a principal liga de futebol do mundo, os árbitros fazem parte de uma entidade chamada Professional Game Match Officials Limited (PGMOL), grupo afiliado às organizações que regem o futebol inglês.
Entre árbitros e assistentes, mais de 300 profissionais se dividem em jogos da primeira e segunda divisão do futebol inglês. Tratado como profissão, os árbitros realizam treinos, possuem um robusto sistema de análise de desempenho, e um salário fixo, além da bonificação por jogo apitado.
Segundo dados obtidos pela Goal, um árbitro no futebol inglês recebe um salário anual entre 38, 5 mil (R$ 241 mil, na conversão) e 42 mil libras (R$ 263 mil, na conversão), de acordo com a sua experiência. Além disso, há um bônus de 1.150 libras (R$ 7.213, na conversão de valores) por partida trabalhada.
Já no futebol brasileiro, não há um valor fixo e o árbitro só recebe se apitar um jogo. Na Série A, o valor varia entre R$ 4.700 e R$ 6.500 por partida. A remuneração é maior no caso de árbitro do quadro da Fifa.
“No Brasil, o árbitro ganha por jogo, ele depende de uma escala. Se o diretor de árbitros não gosta dele, e ele fica um mês sem apitar e não ganha nada. Se ele se lesiona, não recebe. Como fica a família dele? Imagina a cabeça do árbitro, a pressão que sente”, questiona Marsiglia.
Embora algumas pessoas afirmem que a realidade do futebol brasileiro seja infinitamente diferente do inglês, e que a profissionalização da arbitragem seja uma utopia no país, o balanço financeiro da CBF mostra que se há um momento para propor essa discussão, é agora.
Em 2022, a entidade teve um faturamento de R$ 1,2 bilhão, com um lucro de R$ 143 milhões.
Há de se pensar que um investimento nas pessoas que regem o espetáculo deve trazer um retorno grande ao futebol brasileiro, elevar o nível do jogo, e, com isso, diminuir o número de polêmicas desnecessárias.